No alvorecer do dia, o moleiro, já estava
a caminho da freguesia do Castanheiro do Sul.
Os seus animais, um macho valentão, com cinco taleigos de farinha e
a velha bur-ra, que mesmo assim suportava três taleigos mal cheios, subiam a encosta do monte redondo numa passada firme,
outro animal que não faltava era a violeta, uma cachorrinha que conseguia farejar um coelho a cem metros!!! Era uma
companhia para todo e qualquer lugar.
O moleiro seguia atrás, para verificar a carga dos animais, levando
consigo uma boa merenda para o dia que iria ser grande, não era só descarregar a farinha, era necessário ir a
freguesia do Pereiro recolher milho e algum centeio aos seus clien-tes habituais.
Quando chegava a casa do cliente, pesavam a farinha para verificar se não
have-ria algum engano. Dependendo das distâncias e do próprio caudal do rio, a maquia poderia ser variável, mas normalmente
em cada doze quilos de cereal era retirado dois ou três quilos de farinha, que correspondia ao trabalho do moleiro.
Depois de entregar a farinha e de fazer a recolha do cereal no Pereiro
era hora de arrochar a carga em perfeitas condições, não fosse o diabo tece-las.
Nestes dias de entrega e recolha de farinha e cereal, o moleiro quase sempre, bebia
mais, do que o corpo lhe pedia. Os animais preparados, começavam a viagem de volta ao moinho, o moleiro
seguia a frente dos animais para o caso de ser necessário mandar parar os animais e para isso bastava a ele
levantar o bengalão que os animais ficavam de sentido.
Nesse dia, o bengalão nem para amparar o moleiro serviu, o vinho
começa-lhe a subir á cabeça, um suor gelado corre-lhe pela testa, as pernas a fraquejarem e des-falece encostado a beira
do caminho, dois tintos a menos e nada disto lhe sucederia, adormecer no caminho.
Os animais arreados com a preciosa carga é que não ficaram a espera do
dono acordar, ficou a violeta, deitada ao lado do moleiro lambendo-lhe o suor.
O macho e a burra também não tiveram grande sorte, não estava nem a mulher
do moleiro, nem os filhos para descarregarem a pesada carga, tinham ido recolher uma lenha que restava da última poda.
Entretanto a burra ferra uma dentada num dos taleigos de cereal que estavam
no dorso do macho, o milho jorra sobre a soleira do moinho servindo de jantar aos po-bres animais.
Passado algum tempo, chega o moleiro e deparando com aquele
quadro, corre em direcção aos animais com o bengalão no ar e dá umas bengaladas na burra que parece ficar entre a vida e a
morte.
Foram dois, os prejuízos do moleiro, ficou sem o cereal e a burra
ficou em tão mal estado que nem podia com um taleigo de cereal, vendeu-a por tuta e meia aos ciga-nos que por ali passaram,
depois do mal feito não há remédio.